Cultura

A violência pintada no sorriso de Joker

cátia beato

Vertentes artística, psicológica e económica do filme debatidas em tertúlia organizada pela SDDH/AAC. Oradores destacam violência como consequência de uma sociedade desigual. Por Cátia Beato e Francisca Soeiro

“Por Dentro de Joker – Análises entre a ficção e os Direitos Humanos” foi o nome dado à tertúlia organizada pela Secção de Defesa dos Direitos Humanos da Associação Académica de Coimbra (SDDH/AAC). Pelas 20h25 do dia 27 de novembro, o auditório da sala 2.4 do Departamento de Ciências da Vida da Universidade de Coimbra (UC) encheu-se de estudantes. A sessão foi conduzida por Sérgio Dias Branco, Rachel Cesar e Margarida Antunes.

O evento começou com a visualização do ‘trailer’ do filme “Joker”, de modo a enquadrar o público no tema. Sérgio Dias Branco, professor e investigador da UC, abriu o debate com uma reflexão do ponto de vista artístico. Caracteriza a obra como “um retrato do vazio existencial numa sociedade consumista”. Segundo o professor, é arriscada e deprimente devido ao seu conteúdo violento, o que o leva a questionar se glorifica a loucura da personagem principal para gerar empatia com o espetador.

Para o investigador, a obra cinematográfica “não é só a atuação de Joaquin Phoenix”. Explica que simboliza uma explosão pela falta de resposta para os problemas que assombram a sociedade. Além disso, salienta a falta de destaque dado às personagens femininas do filme, sendo estas “pouco desenvolvidas e serviçais ao Joker, uma vez que o filme é feito do ponto de vista de Arthur Fleck”.

Ao refletir sobre os aspetos psicológicos característicos do protagonista, Rachel Cesar, psicóloga clínica, usa a gargalhada como objeto de análise. O personagem sofre de riso patológico, uma doença mental rara que torna o ato de rir incontrolável. Para a psicóloga, esta é a consequência dos maus tratos que Joker sofreu na infância.

Rachel Cesar evidencia a existência real deste problema, associando-o à Síndrome da Criança Espancada. Este diagnóstico engloba qualquer criança que seja vítima de trauma físico provocado pelos cuidadores. Neste caso específico, “está associado à negligência por parte da mãe do protagonista”, refere. Por norma, historial médico deste género leva a uma má inserção na sociedade, acrescenta a psicóloga.

Do ponto de vista económico, Margarida Antunes, docente da UC e economista, começa por estabelecer uma relação entre a década de 1980, época em que se passa o filme, e a atualidade. Na altura houve uma redução do número de trabalhadores protegidos pelo sindicato e Arthur Fleck era um palhaço de profissão mal pago, sem direitos nem proteção social. Isto reflete-se no momento inicial do filme em que há uma greve de funcionários de recolha do lixo.

A economista faz uma comparação entre os negligenciados pelo sistema e o lixo da cidade já por si deteriorada. Margarida Antunes refere que as pessoas viviam em condições precárias porque “a economia assim o dizia”. Deste modo, “as desigualdades sociais são notórias no decorrer do filme”, concluiu. Para a docente este filme traduz mais a realidade atual e não a dos anos de 1980.

No final houve espaço para perguntas do público, que não se reprimiu ao colocar diversas questões do foro psicológico e económico aos oradores. Além das perguntas, quem interveio aproveitou para dar a própria visão do filme.

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